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Tudo tão real, um sonho!

A criatividade da jornalista Clara Favilla pelo Brasil e o mundo Desde criança, além de rabiscar poemas, eu gostava de registrar, em cadernos, as viagens que fiz com [...]

Por Mauricio Santos em 29/12/2019 às 12:54:55

A criatividade da jornalista Clara Favilla pelo Brasil e o mundo Desde criança, além de rabiscar poemas, eu gostava de registrar, em cadernos, as viagens que fiz com meus pais, depois com amigos e, bem mais tarde, sozinha. Viajar sem ter que combinar nada com ninguém é muito, muito bom. Aqui relato travessias que fiz pelo norte de Minas Gerais e mais além, quando aprendi a caminhar por trilhas e veredas, dormir na estrada à espera da chuvarada, passar e amar com devoção o cerrado, a caatinga, o rio São Francisco e alguns de seus afluentes.

Histórias do século passado, quando não tínhamos tablets ou celulares. A novidade, que festejávamos então, era a vitrolinha portátil à pilha que também funcionava à eletricidade, se disponível. Levávamos sempre a preciosidade em nossas andanças de garotas que logo se veriam adultas. De tampa verde-clarinha, fechada era uma maletinha quadrada. Fácil de carregar e bem bonita.

Julho de 1970. Foi com a vitrolinha e nossos bolachões preferidos que chegamos a Belo Horizonte, de ônibus, vindas de Brasília, num domingo qualquer de julho. A cidade ainda acordava. Nas ruas, pouco movimento. Só seguiríamos para Bom Despacho à noite. Guardamos nossa pouca tralha toda no depósito da rodoviária e corremos atrás do café da manhã.

Depois de nos esbaldar com pães de queijo quentinhos, passamos pelo Parque Municipal, demarcado antes mesmo de Belo Horizonte nascer. Fez parte do projeto original da cidade, que já lhe engoliu mais de dois terços de seu verde. O arquiteto e paisagista francês Paul Villon sonhou e conseguiu, para a capital de Minas Gerais, a glória de ter, no final do século XIX, o maior parque urbano da América Latina.

Ponte no Parque Municipal ainda pode ser vista em Belo Horizonte

Leonides de Carvalho Filho/Arquivo Pessoal

O parque encolheu. Mas continua lá a velha ponte de madeira, pontezinhas, lagoas. Árvores centenárias: figueiras, jaqueiras, ciprestes-calvos, flamboyants, eucaliptos, sapucaias, paus-mulatos e paus-reis. Abrigos de bem-te-vis, tucanos, sabiás, garças e periquitos. De morcegos atrás de frutas e insetos, gambás-de-orelha-branca e miquinhos traquinas. Abelhas, bichos-paus, besouros, formigas e borboletas. Folhas que curam: erva-doce, melissa, arruda, boldo, bálsamo, hortelã-pimenta, funcho, erva-cidreira, chapéu-de-couro e quebra-pedra. Gente com e sem pressa, pais e seus meninos, pedintes maltrapilhos, ambulantes e suas quinquilharias, namorados inconvenientes, todos querem-lhes a sombra, a brisa, o mel, o remédio.

Stella nos aponta a beleza escultural dos paus-mulatos. Ancestrais dessa árvore viajaram desde a Amazônia para que também aqui nos maravilhassem. São garbosas, retilíneas e podem alcançar quarenta metros de altura. Todos os anos, descascam-se em longas tiras verticais, deixando à mostra troncos de superfícies lisas, brilhantes e avermelhadas. Ao trocarem de pele, livram-se de pragas, doenças e plantas parasitas. Ramificam-se apenas nos topos e, como era inverno, testemunhamos como florescem: estrelinhas perfumadas em pencas que produzem muito néctar para a delícia de abelhas e borboletas em revoadas.

Sem tanto tempo para outras contemplações, deixamos com certa pena o parque para trás. Continuamos nossa caminhada por alamedas asfaltadas e ruas estreitas calçadas, gramas nos vãos das pedras gastas. Praças, casas bonitas, vitrines, artesãos, vendedores de pastéis quentinhos ao longo das avenidas. Igrejas. Vaivém domingueiro. Quinze anos antes, estive aqui pela primeira vez. A cidade está no caminho de Brasília para quem sai do sul de Minas e não quer avançar até Campinas, em São Paulo, e só depois tomar a direção do centro-oeste.

(continua na próxima semana)

* Clara Favilla é jornalista e escreve uma vez por semana sobre viagens

Fonte: G1

Tags:   G1
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