A obra Sol: a pajé surda ou Séno Mókere KĂĄxe Koixómuneti, em lĂngua terena, conta a história de uma mulher indĂgena surda anciã chamada KĂĄxe que exerce a função religiosa de pajé (Koixómuneti) em sua comunidade. Ao ser procurada para auxiliar em um parto e após pedir a benção dos ancestrais para o recém-nascido, o futuro do povo terena é revelado e transmitido a ela em sinais. "A história mostra um pouco da rica cultura desse povo, as situações, consequĂȘncias e resistĂȘncia após o contato com o povo branco", revela Souza.
Inspirada na história real do povo terena, a narrativa apresenta a comunidade em uma época em que ela ainda vivia nas Antilhas e era designada pelo nome AruĂĄk.
A pajé KĂĄxe, procurada por uma mulher em trabalho de parto, ajuda no nascimento do pequeno Ilhakuokovo.
A partir daĂ, a obra ilustra um pouco da trajetória desses indĂgenas e da sua instalação em território brasileiro. Buscando caminhos que levasse aos Andes, em meados do século XVI, os espanhóis estabeleceram relações com os terena, à época chamados de GuanĂĄ, na região do Chaco paraguaio. A chegada dos brancos acarretou muitas mudanças nas vidas dos indĂgenas, que procuraram, durante certo perĂodo, locais onde pudessem exercer seu modo de vida sem a influĂȘncia da colonização.
Assim esse povo chegou ao Brasil, no século XVIII, e se instalou na região do Mato Grosso do Sul. Mesmo em outras terras, os conflitos trazidos pela colonização ainda eram um problema. A Guerra do Paraguai envolveu os terena, que foram forçados a participar para garantir seus territórios e, no conflito, perderam muitos membros de sua comunidade. Após a guerra, questões territoriais continuaram causando embates. Nesse perĂodo, os terena se viram obrigados a trabalhar nas fazendas da região, situação que ocasionou a servidão dos indĂgenas.
Segundo a UFPR, com informações da Comissão Pró-Ăndio de São Paulo, algumas famĂlias dessa população indĂgena se mantiveram às margens das fazendas, ocupando pequenos nĂșcleos familiares irredutĂveis à colonização. Foram essas ocupações que, regularizadas no inĂcio de século XX, formaram as Reservas IndĂgenas de Cachoeirinha e Taunay/ Ipegue.
A orientadora do trabalho e coordenadora do projeto de pesquisa institucional HQs Sinalizadas, Kelly Priscilla Lóddo Cezar, destaca que trabalhar com diferentes lĂnguas envolve conhecimentos históricos com e sem registros escritos." É necessĂĄria uma grande entrega à pesquisa e o Ivan fez isso com louvor. Além de encantar o povo terena com a HQ, os pesquisadores participantes e colaboradores se encantaram com seu empenho e sua autonomia invejĂĄvel, permeados de humildade".
As ilustrações da HQ foram feitas por Julia Alessandra Ponnick, que é acadĂȘmica do curso de Design GrĂĄfico da UFPR, autora, ilustradora e roteirista de histórias em quadrinhos. A defesa do TCC de Souza estĂĄ agendada para o final de março, com o lançamento oficial da história.
O projeto da UFPR HQs Sinalizadas trabalha com temas transversais dos artefatos da cultura surda – história, lĂngua, cultura, saĂșde. O objetivo é criar, aplicar e analisar histórias em quadrinhos sinalizadas como uso de sequĂȘncias didĂĄticas bilĂngues para o ensino de surdos. Além da elaboração de materiais bilĂngues capazes de auxiliar na aprendizagem, a proposta permite aprofundar os estudos linguĂsticos como prĂĄtica social.
Todas as HQs produzidas pelo grupo apresentam vĂdeos sinalizados, desenhos, ilustrações e escrita do portuguĂȘs. "Essas linguagens podem ser utilizadas, especialmente, quando a proposta destina-se a contemplar os temas transversais como ética, orientação sexual, meio ambiente, saĂșde, pluralidade cultural, trabalho e consumo, congregando professores e pesquisadores de diferentes ĂĄreas do conhecimento", sugere Kelly.
*Com informações da Universidade Federal do ParanĂĄ (UFPR)
Fonte: AgĂȘncia Brasil/Divulgação/UFPR